Ibañez Conservação Auditiva    

 

                                                                                                          

Opinião 

Pessoas Portadoras de Deficiência Auditiva e 

Trabalho com Exposição ao Ruído  

   Raul Nielsen Ibañez


 

A legislação que tenta garantir a colocação de pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho foi consolidada no Decreto Nº 3.298 da Presidência da República, em 1999. Em seu texto, a referência às deficiências auditivas foi pouco detalhada e deu margem a interpretações que em nada contribuíram com a inserção pretendida. O Decreto Federal Nº 5.296 de 02/12/2004, em seu artigo 70, altera a redação do Art. 4º do Decreto Nº 3.298, e determina que seja considerada pessoa portadora de deficiência auditiva aquela que apresenta em seu exame audiométrico do melhor ouvido 41 ou mais decibéis nas frequências de 500, 1000, 2000 e 3000 Hertz, restando apenas a dúvida sobre a utilização ou não da média dessas frequências. Este Decreto atende, pelo menos em parte, ao clamor dos profissionais especialistas em audição humana, os quais frequentemente passavam pelo constrangimento de listar como deficientes, de acordo com a Lei, trabalhadores com a audição social preservada. Entretanto, é entendimento do Ministério do Trabalho e Emprego, por intermédio de Nota Técnica emitida pelo auditor Daniel M. S. Chagas e aprovada pela Secretaria de Inspeção do Trabalho  em 08/12/2005, que as contratações que atendiam ao Decreto Nº 3.298 e que foram efetuadas antes de 02 de dezembro de 2004 devem ser consideradas válidas e cumprem as cotas determinadas pela legislação. Quandos estes empregados encerrarem seus contratos de trabalho, aí sim, seus substitutos devem atender ao preconizado no novo Decreto.

Mas as interpretações estranhas não param por aí. Tem sido frequente a contratação de deficientes auditivos profundos para trabalharem em áreas de ruído excessivo. Isto é absolutamente equivocado. Estas pessoas tem contra-indicação universal de exposição ao ruído. Geralmente o pouco que lhes resta de audição, chamado de "resto auditivo", é o que lhes garante algum grau de comunicação sonora com o ambiente, ainda que precária, e pode viabilizar a adaptação a um aparelho auditivo. Além do mais, cresce a possibilidade de acidentes de trabalho, muitas vezes evitados por alertas dos colegas ou por outros sons relacionados ao evento gerador do acidente.

Sobre a impossibilidade de aproveitar deficientes auditivos profundos em áreas ruidosas podem ser citados o Boletim Nº 3 do Comitê Nacional de Ruído e Conservação Auditiva e o Manual para a Inserção da Pessoa Portadora de Deficiência da Procuradoria Geral do Ministério Público do Trabalho. O Comitê considera de "alto risco a admissão do trabalhador com perda auditiva neuro-sensorial causada por agente etiológico que não o ruído e que comprometa as freqüências de 2000 e/ou 1000 e/ou 500 Hertz". Já a Procuradoria Geral do Trabalho é definitiva: "De acordo com a atividade da empresa nem todas as funções são passíveis de serem exercidas por pessoas portadoras de deficiência, sem que isso implique risco a elas mesmas ou a seus colegas de trabalho. ...deve ser evitado associarem-se determinadas deficiências a atividades pretensamente com elas compatíveis, como cegos trabalhando em câmaras escuras, surdos em lugares com excessivo ruído, etc.". 

 

Porto Alegre, 14 de março de 2010.

 


Raul Nielsen Ibañez é médico, especialista em Otorrinolaringologia e Medicina do Trabalho.

 

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