LACERDA, M.N. & NUDELMANN, A.A. - Perda Auditiva Induzida pelo Ruído na Gravidez. In: NUDELMANN, A.A.; COSTA, E.A.; SELIGMAN, J.; IBAÑEZ, R.N. - PAIR Perda Auditiva Induzida pelo Ruído. Porto Alegre, Bagaggem Comunicação, 1997. 

 

Perda Auditiva Induzida pelo Ruído na Gravidez

 

Marja Nicolini Lacerda

Alberto Alencar Nudelmann


 

1. Introdução

As mulheres grávidas devem estar conscientes de que a saúde de seus filhos depende de seu próprio bem-estar. Assim, devem evitar álcool, fumo, drogas, exercícios intensos, traumas físicos e emocionais. Entretanto, não possuímos dados conclusivos que indiquem se o ruído deve ou não ser incluído nesta lista.

Reconhecimento, estudo e controle dos potenciais riscos ao feto nos locais de trabalho são problemas complexos com grande alcance na área médico-trabalhista e implicações legais. Destes, nos fixaremos no ruído ocupacional, embora saibamos que, em sua jornada de trabalho, as mulheres grávidas estão expostas a outros riscos.

O Comitê de Audição, Bioacústica e Biomecânica Americano, citado por NIEMTZOW (1982), afirma que a atenuação do ruído pelos tecidos líquidos que circundam o feto humano é de 20 a 25 dB para as freqüências de 50 a 200 Hz; 25 a 30  dB para 500 Hz; 40 dB para 1000 Hz; 50 dB para 2000 Hz e 70 dB ou mais para 4000 Hz e freqüências mais altas.

Segundo a mesma fonte, essa atenuação permite extrapolar níveis de exposição em ambiente com ruídos que não excedam a 105 dB de 50 a 200 Hz; 110 dB para 500 Hz; 125 dB para 1000 Hz; 135 dB para 2000 Hz e 155 dB ou mais para 4000 Hz ou freqüências mais altas. Nessas circunstâncias, os ruídos não seriam potencialmente lesivos ao feto.

Outros pesquisadores, citados por CAMPO, estudaram também a atenuação oferecida pela parede abdominal e uterina por diferentes métodos. Segue quadro: Figura 1.

 

 

Atenuação (em dB) das paredes abdominal e uterina nas diferentes freqüências

 

Captador Local   Autores   200 250 400 500 1000 2000

4000

8000 Hz

Microfone

MIC H 3/3

Colo do útero

Bench (1968)

19   - - -

24

38

48

-
Microfone BK 4136   Placenta próximo à cabeça do feto Walker et col. (1971)   25   - - - 33 37 48 70
Microfone BK 8103   Útero após o parto   Smeja et col. (1979)   - - - 10,1 16,4 20,6 20 28,7
Microfone BK 8103   Útero após ruptura da bolsa Querleu et col. (1981)   - - 2 - 14 20,4 26 -

 

 

 2. Ruído e Estresse

Em recentes estudos citados por KURPPA & SORRI não foi pesquisada perda auditiva em filhos de mulheres grávidas expostas ao ruído ocupacional (superior a 80 dB) em diversos postos de trabalho (metalúrgicas, indústrias químicas, de plásticos, têxteis, agricultura, restaurantes e serviços de saúde), mas sim alterações de desenvolvimento fetal, baixo peso ao nascer e prematuridade.

Não foram observadas alterações significativas nestes fatores, nem mesmo em animais mamíferos (suínos, eqüinos e bovinos). Em ovinos observou-se multi-ovulação causada pelo ruído. Outro trabalho de PUJOL citado por ABRAMS, também em ovinos, constatou a possível vulnerabilidade da cóclea fetal em formação, quando exposta ao ruído. Esse trabalho indica ainda a possibilidade de que tal fato ocorra em fetos humanos de mulheres grávidas expostas por longo tempo a ruídos e vibrações.

Já em roedores, houve retardo no crescimento e anomalias fetais atribuídas aos elevados níveis de catecolaminas, que causam constrição nos vasos placentários, com subseqüente hipoxia fetal.

 

3. Perda auditiva fetal

LALANDE e colaboradores citam um estudo realizado no Canadá com filhos de mulheres que no último trimestre de gestação ficaram expostas a ruído ocupacional de 65 a 95 dB durante oito horas por dia. O estudo concluiu que:

1) o grupo cujas mães ficaram expostas a faixa entre 85 e 95 dB mostrou um aumento de três a quatro vezes no risco de perda auditiva se comparado com aquele cujas mães ficaram expostas a doses menores, entre 65 e 85 dB;

2) existia um aumento significativo no risco de perda auditiva na freqüência de 4000 Hz quando estas exposições envolviam um forte componente de ruído de baixa freqüência.

Este último item retifica a informação do Comitê de Audição, Bioacústica e Biomecânica Americano, que afirma serem as baixas freqüências menos atenuadas pelos tecidos e líquidos que circundam o feto.

 

4. Conclusão

Após esta revisão bibliográfica, constatamos que: 

1) poucos trabalhos abordam este assunto;

2) não possuímos nenhum que tenha acompanhado crianças expostas a ruído ocupacional durante sua gestação;

3) nada de conclusivo foi feito relacionando ruído ocupacional e gravidez.

Segundo NIEMTZOW, o trabalho de LALANDE - único que trata especificamente do assunto do assunto - não possui grande valor, devia à falta de grupo controle em sua pesquisa.

Baseado nas conclusões do Comitê de Audição, Bioacústica e Biomecânica Americano e de vários pesquisadores, segundo as quais, ruídos de baixas freqüências (abaixo de 500 Hz) são poucos atenuados, sugerimos que trabalhadoras grávidas sejam afastadas temporariamente de postos de trabalho que apresentem esse tipo de ruído. Bem como, ruídos superiores a 85 dB, que segundo LALANDE aumentam o potencial risco de lesão à cóclea do feto.

 

5. Referências Bibliográficas

 

1. ABRAMS, R.M. - Third International Conference on Sound and Vibration in Pregnancy: Women at Work. American Journal of Industrial Medicine. 23:527-9 (1993).

 

2. CAMPO, P. & CNOCKAERT, J.C. - Risques auditifs encourus par le foetus chez la femme enceinte exposée au bruit. Centre de Recherche I'IRES - documentaires n° 137 - 4° trimestre 633-7 (1989).

 

3. KURPPA, K.; RANTALA, K.; NURMINEN, T.; HOLMBERG, P.C.; STARCK, J. - Noise exposure during pregnancy and selected structural malformations in infants. Scand. J. W. Environ & Health, 15:111-6 (1989).

 

4. LALANDE, N.; HETÚ, R.; LAMBERT, J. - Is Occupational Noise Exposure During Pregnancy a Risk Factor of Damage to the Auditory System of the Fetus? American Journal of Industrial Medicine, 10:427-35 (1986).

 

5. MacDONALD. A.D.; MacDONALD, J.C.; ARMSTRONG, B.; CHERRY, N.M.; NOLIM, A.D.; Robert, D. - Prematurity and Work in pregnancy. British Journal of Industrial Medicine. 45:56-62 (1988).

 

6. NIEMTZOW, R.C. - Loud Noise and Pregnancy. Military Medicine. 158:10-2 (1993).

 

7. PERSAUD, T.V.N. - The Pregnant Woman in the Work Place: Potential Embryopathic Risks. Anat. Anz., Jena 170 (1990) 295-300 VEB Gustav Fischer Verlag Jena.

 

8. SORRI, A.; SORRI, M.; ANTTONEN, H.P.; TUIMALA, R.; LAARA, E. - Occupational noise exposure during pregnancy: a case control study. Int. Arch. Occup. Environ. Health 60:279-83 (1988).